O cheiro de mofo se espalhava por toda uma pequena sala subterrânea de um cemitério municipal na cidade de Saitama (província homônima) no final de novembro do ano passado, onde cerca de 600 urnas não retiradas preenchiam as prateleiras.
Apontando para a única prateleira vazia na sala, Satoru Shimizu, funcionário representante de Saitama, disse que não demoraria muito até faltar espaço, visto que o número de urnas com restos mortais não retiradas vem aumentando nos últimos anos.
Parentes não coletam as urnas citando a falta de relação próxima com a pessoa falecida
Saitama é um dos muitos municípios nesta nação com rápido envelhecimento populacional que luta para lidar com as cinzas e fragmentos de ossos que restam após um corpo ser cremado e que ninguém vem coletar. Antigamente, as cinzas não retiradas eram geralmente de pessoas cujas identidades não podiam ser traçadas.
Segundo funcionários do município, hoje em dia, grande parte dos restos mortais não retirados podem ser traçados. A maioria dos mortos têm parentes vivos, mas eles se recusam a cremar os corpos ou coletar suas cinzas por razões que geralmente têm a ver com a falta de relação próxima com a pessoa falecida.
Mais pessoas vivendo sozinhas
Essa é uma das duras realidades da sociedade em envelhecimento do Japão, onde cada vez mais há idosos vivendo sozinhos, sobrevivendo com uma pequena renda ou com ajuda social, dizem observadores.
Segundo estimativa do Instituto Nacional de População e Pesquisa de Segurança Nacional, o número de mortes crescerá de 1,25 milhão em 2015 para 1,65 milhão em 2035. Dados do governo, enquanto isso, mostram que 13,3% dos homens e 21,1% das mulheres com 65 anos ou mais estavam vivendo sozinhos em 2015, comparado a 4,3% e 11,2% em 1980, respectivamente.
Quando ninguém se apresenta para se responsabilizar pelo falecido, os municípios são encarregados pela cremação, o que implica custos de 200 mil a 250 mil ienes por caso. Os municípios também enfrentam dificuldades em encontrar espaço suficiente para armazenar o crescente volume de urnas, que geralmente são mantidas por alguns anos no caso de alguém aparecer para coletá-las.
Embora não haja números oficiais para o volume de urnas não retiradas em todo o Japão, no caso de Saitama, a quantidade recém adicionada aumentou de 33 em 2003 para 133 em 2016. No total, a cidade manteve mais de 1.600 urnas no ano passado. Visto que o número poderá aumentar, Saitama planeja abrir um novo galpão em 2020 para enterrar as cinzas daqueles que foram esquecidos.
“Acredito que essa seja a única medida que podemos tomar agora – enterrar as cinzas após armazená-las por alguns anos”, disse Shimizu.
Cidade em Kanagawa lança programa para ajudar idosos a se preparem para a morte
Buscando reduzir o número de urnas com cinzas não retiradas e que acabam em uma sala de armazenamento para os negligenciados, a cidade de Yokosuka (Kanagawa), lançou um programa em 2015 para dar apoio aos idosos com baixa renda que não têm ninguém com quem contar sobre como se preparar para a morte.
Chamado de “plano de suporte para o fim”, o programa oferece aos residentes, cuja renda mensal seja abaixo de 180 mil ienes, tenham economias de 2,25 milhões de ienes ou menos e cuja propriedade tenha valor de cinco milhões de ienes ou menos, um serviço para cremação e descanso final, pago enquanto ainda estão vivos.
O preço é de cerca de 250 mil ienes, praticamente o mesmo que a cidade paga para cremar e armazenar cinzas não retiradas. Os participantes podem escolher onde querem ser cremados e têm suas cinzas armazenadas, de acordo com Kazuyuki Kitami, vice-diretor na divisão de bem-estar social de Yokosuka.
A cidade notifica a empresa funerária quando tais cidadãos morrem e fazem o acompanhamento para ter certeza que as tarefas estão sendo executadas como prometido.
Desde seu lançamento, 23 pessoas se registraram para o programa. Delas, três faleceram e suas cinzas foram armazenadas e cuidadas em um cemitério bem mantido de um templo, disse Kitami.
Como Saitama, o número de urnas com cinzas não retiradas em Yokosuka aumentou de 16 em 2013 para 60 em 2014, de acordo com Kitami. Incapaz de armazenar todas as urnas em um espaço municipal para aquelas não retiradas, a cidade removeu 600 delas na última década.
As cinzas foram retiradas das urnas e enterradas juntas no campo de um oleiro.
Fonte e imagem: Japan Times